Sempre que possível Abelardo senta-se no
último banco do ônibus, joga na rua o
primeiro caderno sem ler sequer as manchetes
e começa a leitura da única matéria que lhe
importa. Segundo caderno, críticas e
anúncios de filmes.
Abelardo
conhece todos os cinemas de Belo Horizonte,
Nova Lima, Contagem, e alguns até
em Sete Lagoas, Itabira ou
Itaúna. De segunda a sexta-feira, sem falhar
um dia sequer, a não ser por doença ou
reunião na matriz da fábrica em Patrocínio,
Abelardo vai ao cinema. Aos sábados e
domingos lê e relê os cadernos culturais de
todos os jornais de Belo Horizonte, catando
os filmes que irá ver durante a semana. Que
o filme seja a preto e braço ou a cores,
seja bom ou ruim, não importa. Para Abelardo
importa, sim, que tenha, pelo menos, uma
mulher de seios grandes e que ela tire o
sutiã. O que Abelardo gosta de ver no cinema
são os seios das mulheres enquanto elas
andam ou tomam banho. As cenas de
striptease, com todos os
movimentos estudados, mecânicos, não
o atraem. O que mais excita Abelardo são
seios soltos, abanando.
Marileia, a
esposa de Abelardo, é uma mulher bonita. No
banco, atendendo clientes, ou tomando banho
de sol na piscina do Clube Rio Doce, poucos
são os homens e mulheres que não a olham.
Mas, apesar dos vinte e cinco anos e da
beleza, Marileia não é a mulher com quem
Abelardo gostaria de ter casado. Abelardo
gosta de mulheres com seios grandes e os
seios de Marileia cabem na palma da mão.
Abelardo tem
quarenta anos, mas foi só no mês passado que
conseguiu realizar o maior desejo da sua
vida. Ter nas mãos uns seios iguais aos que
vê no cinema e nas revistas de mulher nua.
Quando Shirley fechou a porta do quarto e
começou se despindo, Abelardo ficou duro,
sem fôlego, os olhos cravados naqueles seios
enormes, redondos, estofando o sutiã e
sobrando pelo decote. Encostada nos pés da
cama, Shirley nota o olhar de Abelardo e
tapa os seios com as mãos. A maior parte dos
homens fala do tamanho mas alguns até que
gostam. Shirley olha Abelardo e abre um meio
sorriso. Será que este vai gostar? Tomara
que goste, minha Nossa Senhora, tomara que
goste. Shirley tira as mãos dos seios com
cuidado.
- Não são
muito caídos, não, sabe?
Abelardo não
responde, a boca seca e os olhos pregados na
carne mole que sobra do sutiã.
- Eu não deixo
ninguém apertar muito e só dou banho de água
fria. Diz que faz bem.
A garganta de
Abelardo aperta e dói e rasca, de tão seca.
Meu Deus do céu, ah meu Deus. Tremendo, as
pernas duras, mal podendo dar um passo,
Abelardo aproxima-se de Shirley. Shirley
sorri e tira a saia. Graças a Deus, minha
Nossa Senhora, graças a Deus este gosta. Faz
um ano que Shirley botou ponto num quarto
duas casas abaixo da casa de Abelardo e
sempre notou os olhos dele cravados no
decote quando se cruzavam na rua ou ele
passava e ela, parada na porta da casa,
esperava que alguém quisesse entrar. Naquele
dia Abelardo chegou mais cedo. Conseguiu
pegar a primeira sessão do cinema Regina, na
rua da Bahia, e viu Shirley folheando
revistas na banca de Miquelino.
Aproximou-se, pegou também uma, mas nem a
abriu. Como sempre, os olhos cravaram-se no
decote de Shirley. Ela notou o olhar de
Abelardo e sorriu. Por favor, minha Nossa
Senhora, por favor, já devo mais de mês de
aluguel. Abelardo continua com a revista na
mão. Meu Deus do céu, ah meu Deus. Shirley
continua olhando Abelardo. E agora, minha
Nossa Senhora? Será que ele vai querer?
Fecha a revista e coloca-a na banca.
- Vamos?
Abelardo não
responde. Não consegue, a garganta doendo e
rascando e as pernas tremendo, imaginando
como seriam aqueles seios esparramados num
lençol. Abelardo é um tímido. Sempre foi.
Por isso compra todas as revistas de mulher
nua que Miquelino lhe
guarda, vai ao cinema todos os dias e vê e
revê os filmes de Izabel Sarli. Sempre
imaginando o que faria com os seios que vê
no cinema ou nas revistas, se as mulheres
deitassem na cama junto ele.
Abelardo casou
com Marileia há dois anos. Um mês após a
morte da mãe, o pai morto no dia em que deu
baixa da Aeronáutica, atropelado por um
ônibus na av. do Contorno. Marileia era
recepcionista do Banco da Lavoura de Minas
Gerais, Agência Centro, morava no Alto dos
Pinheiros e o seu maior sonho era viver na
zona sul, ali bem no centro da Savassi, as
ruas sempre iluminadas e as vitrines sempre
com as melhores roupas da moda. Abelardo
conheceu Marileia no banco, ao transferir as
economias da mãe para a sua conta pessoal.
Um mês depois estava casado, Marileia
querendo descer para a zona sul de qualquer
jeito e Abelardo solitário, angustiado, com
pavor de viver só, agora que a mãe tinha
morrido. Mas, mesmo com a beleza e o corpo
bem feito de Marileia, Abelardo descobriu,
logo na primeira noite da lua-de-mel, que
Marileia não era a mulher com quem devia ter
casado. Os seios de Marileia cabem na palma
da mão e Abelardo só se excita com mulheres
de seios grandes.
Abelardo gosta
de ver as mulheres nuas no cinema e nas
revistas porque assim pode imaginar o que
quiser, seja botar aqueles seios nus
esparramados num lençol ou deixá-los
balançando molemente na frente de um
espelho. E ele olhando, só olhando. Com
Marileia, não. Os seios de Marileia não são
nem seios e ela está sempre ali, sempre
falando, sempre querendo, e Abelardo não
pode imaginar, tem que fazer. Com Marileia,
apesar de ter casado apenas pelo pavor de
estar só, Abelardo tem que fazer, e Marileia
todas as noites quer fazer.
Abelardo não
sabe por que só se excita com mulheres de
seios grandes. Nunca contou a ninguém e,
agora, tem vergonha de falar seja a quem
for. Quando menino, era a mãe que lhe dava
banho, que o enxugava, que o metia na cama e
que gostava de o vestir. E Abelardo também
gostava de ver o corpo branco da mãe, ambos
no banheiro tomando banho, o pai
guarda-noturno, no trabalho, Abelardo
passando sabão nos seios dela, grandes,
macios como geléia, ela ensaboando o corpo
dele, ele tremendo de medo e gostosura.
Abelardo já tinha dezesseis anos quando viu
a primeira mulher nua, a não ser a mãe. Foi
num passeio que o colégio fez à mata do
Jambreiro, caminho de Nova Lima. D. Judite,
a professora de ciências, fez-se perdida e
entrou com ele pela mata, Abelardo tremendo,
imaginando, os seios de D. Judite estofando
o sutiã, iguais aos da mãe. Mas quando ela
tirou a blusa e o sutiã, Abelardo gelou. D.
Judite não tinha seios. O volume que
estofava o sutiã era só enchimento de
borracha. Abelardo fugiu, correu pela mata,
desesperado, até que, cansado, ofegante,
parou, encostou-se no tronco de uma árvore e
escutou vozes. Vozes roucas, contidas.
Alguns metros abaixo, junto de uma moita,
Seu Demóstenes, professor de português
abraçava e beijava Florismar, colega de
Abelardo e o maior busto do colégio.
Abelardo olhou a cena, tremendo. E quando
Seu Demóstenes tirou a blusa de Florismar e
os seios apareceram, o coração de Abelardo
disparou. Os seios de Florismar, grandes e
redondos, como ele sempre imaginava,
sobravam no sutiã. E quando Seu Demóstenes
desapertou e tirou o sutiã e os seios,
livres, abanaram como geléia, Abelardo
fechou os olhos e não parou. Masturbou-se
furiosamente até ficar sem forças e quase
cair no chão, os olhos revirados, estrelados
de vertigens. Meu Deus... Shirley tira a
revista das mãos de Abelardo e joga-a na
banca.
- Vamos?
Shirley sorri
e começa andando. Abelardo, mudo, atordoado,
segue-a. Os vizinhos que se danassem. O
importante, agora, era Abelardo poder ver
aqueles seios, iguais aos que via todos os
dias no cinema e nas revistas, Shirley,
deitada de lado na cama e os seios
esparramados no lençol. Shirley já tirou a
blusa e a saia, e vai tirar o sutiã.
Abelardo treme. Meu Deus do céu, ah meu
Deus. Aproxima-se e pega os seios, os dedos
rígidos, a garganta rascando e doendo, as
pernas cada vez mais bambas, parecendo que
vai cair. Abelardo acaricia os seios de
Shirley, aperta-os, mergulha a cara neles,
esfrega-os, abana-os, o corpo duro, as
pernas tremendo, quase caindo. Há anos,
muitos anos, desde que deixou de tomar banho
com a mãe, que Abelardo não acaricia uns
seios como aqueles. Shirley está de pé, os
braços caídos ao longo do corpo, olhando
Abelardo. Abelardo geme, ofegando, excitado,
quase gozando. Por fim, as mãos desajeitadas
desapertam o sutiã e os seios de Shirley,
soltos, caem. Rapidamente, Shirley levanta
as mãos.
- Deixa.
Deixa.
A voz de
Abelardo sai rouca, abafada, rascante. Ele
mesmo tira o sutiã e fica olhando os seios
caídos. Lembra dos seios da mãe e dos seios
de Florismar, e fecha os olhos. Shirley
sorri e mexe o corpo. Os seios parecem
geléia, abanando molemente. Abelardo abre os
olhos e geme. Shirley sorri. Já conheceu
homens assim. Seu Zeló, coitado, Seu Zeló
só gosta de olhar, nem
mexer ele quer. Às vezes pede que Shirley
esfregue os seios no piru dele, mas a maior
parte das vezes, não. Shirley tira a blusa e
o sutiã, fica de pé, Seu Zeló senta na cama,
Shirley abana o corpo, Seu Zeló aperta as
pernas, pega o piru e goza na mão, só
olhando os seios dela abanando, abanando, e
Seu Zeló gemendo e babando, até que cai na
cama, os olhos revirados e a boca aberta,
como se estivesse morto, sem ar, e Shirley
deita ao lado dele e acarinha-o até ele
ficar calmo, poder se vestir e ir embora.
Shirley olha
Abelardo e lembra do pai. Também gemendo,
ficando sem ar e sem falar, toda vez que ela
tomava banho na cacimba e ele vinha e pegava
nos seios dela e ela pegava no piru dele e
ele gozava na mão dela, até que a mãe, um
dia, descobriu e a botou fora de casa.
Abelardo olha Shirley, a garganta rascando e
doendo tanto, que não pode nem falar.
Shirley levanta os seios com as mãos, une-os
e oferece-os. Abelardo mergulha a cara na
carne mole, passa a língua, geme, chupa os
bicos. Shirley sente um calor subir das
coxas e abre as pernas, sorrindo. Ah, meu
Deus do céu, desta vez eu vou gozar.
Desaperta o cinto das calças de Abelardo e
deita-se na cama. Abelardo, desajeitado e
tremendo, tira a roupa e ajoelha-se ao lado
dela, vira Shirley de lado e olha os seios,
um em cima do outro, esparramados no lençol.
E enquanto com uma mão segura neles, com a
outra masturba-se furiosamente. Satisfeito,
feliz por fazer uma coisa que nunca tinha
feito, a não ser com a mãe. Masturbar-se,
acariciando uns seios grandes esparramados
num lençol.
Quatro horas
da tarde. Abelardo Mateus está na porta do
Cine Las Vegas,
na rua Padre Belchior, próximo do Mercado
Central, no centro de Belo Horizonte.
Desde domingo que Abelardo sabe que estaria
hoje no Cine Las Vegas. Segunda foi ao
Lafaiete, terça foi ao México, quarta foi ao
São Geraldo e quinta foi ao Candelária. Mas
para hoje, sexta, Abelardo deixou o melhor.
VERGONHA!!!
UM GRANDE
FILME DE IZABEL SARLI,
A MAIOR
NUDISTA DA AMÉRICA DO SUL,
EM EXIBIÇÃO
EXCLUSIVA NESTE
CINEMA.
Abelardo já
viu Vergonha,
já viu Um Rio se Enche de
Sangue, já
viu Favela,
já viu Índia,
já viu Sedução Tropical.
Abelardo já viu todos os filmes de
Izabel Sarli que passaram
em Belo Horizonte,
em Nova Lima,
ou
em Sete Lagoas. Uma vez,
numa semana mais fraca, Abelardo foi até
Divinópolis rever Sedução
Tropical. Chegou
em casa de madrugada, Marileia preocupada,
querendo saber o que tinha acontecido,
Abelardo confuso, sem poder contar, mas
satisfeito. Tinha gozado no cinema, gozou
depois no banheiro, e gozou ainda dentro do
ônibus, recordando todas as cenas em que
apareciam os seios de Izabel Sarli, nus,
abanando como geléia.
O pessoal da
primeira sessão começa saindo. Abelardo
compra uma entrada, olha os cartazes mais
uma vez e entra no cinema. Vai ao banheiro,
de tanto entrar em banheiros malcheirosos
Abelardo já nem sente o fedor, fecha-se num
reservado, coloca o lenço dobrado dentro da
cueca, para evitar que a porra manche as
calças, e volta. Olha o salão, meia dúzia de
pessoas espalhadas pelas últimas filas,
escolhe um lugar nas primeiras, exatamente
no meio da quinta, e senta-se, cruza as
pernas e coloca a pasta dos pedidos em cima
dos joelhos. Pouco depois as luzes apagam e
Abelardo ajeita-se na cadeira. Passam
documentários, jornais, trailers
e um filme antigo de Jean Manzon,
como sempre fazendo propaganda de uma
empresa do governo. Abelardo impacienta-se.
Mas que merda, caralho. Outro
trailer. Mulata.
Abelardo retesa-se na cadeira. Na tela,
várias mulatas dançam nuas numa praia, os
seios enormes balançando. Abelardo sorri,
satisfeito. Graças a Deus, semana que vem já
sei onde venho.
O filme
começa. Abelardo já o viu no Regina, já o
viu no Candelária, já o viu no São Geraldo,
já o viu no Lafaiete e já foi vê-lo
em Nova Lima
e
em Contagem. Mexe-se na
cadeira, impaciente, e aperta as coxas,
esperando a hora dos banhos de Izabel Sarli.
Principalmente o segundo. Mais demorado e
com os seios vistos de mais perto, melhores
para gozar.
Começa o
primeiro banho. Abelardo olha a tela e
aperta as coxas com força. Sabe que não vai
gozar, os seios de Izabel Sarli ficam
debaixo da água a maior parte do tempo, mas
já é uma preparação para o segundo banho.
A cena
termina. Abelardo tem as coxas bem apertadas
para manter a ereção, mas desvia os olhos da
tela. Olha o salão, vazio e lembra-se do
cinema Candelária, na praça Raul Soares,
meses atrás. As Feras do Asfalto,
filme inglês. Sexta-feira, salão
cheio. Abelardo chega tarde e procura, mas
não consegue encontrar um lugar isolado.
Quando a primeira mulher nua aparece na
tela, Abelardo começa suando. Quando aparece
a terceira, Abelardo já está tenso, sem
poder fazer um movimento sequer, as cadeiras
de ambos os lados ocupadas. Quando a quinta
mulher apareceu na tela, Abelardo já tinha
decidido que se levantaria e iria
masturbar-se no banheiro. Tira a pasta de
cima dos joelhos e começa fazendo o primeiro
movimento para se levantar quando sente uma
mão apertar-lhe o pau, doendo de tão duro.
Rapidamente, coloca a pasta de novo em cima
dos joelhos e abre as pernas. Quando a sexta
mulher apareceu na tela, Abelardo teve que
cerrar os dentes e morder a língua para não
gritar, de tanto que gozou. A mão que lhe
acariciava o pau fazia-o com tanta maciez,
com tanta habilidade, que Abelardo gozou
duas vezes. Era mão de homem. Mas que
importava, se ele estava gozando como gozava
com a mãe, os seios da mulher abanando
molemente e a mão desconhecida continuando a
masturbá-lo?
As primeiras
imagens do segundo banho de Izabel Sarli
aparecem na tela. Abelardo ajeita-se na
cadeira, o pau ainda duro pela lembrança do
cinema Candelária, e aperta as coxas com
mais força. É agora, meu Deus. Izabel Sarli,
focada de perto, toma banho nua, os seios
abanando na superfície da água. Abelardo
aperta as coxas com força, a atenção toda
fixada na tela. Sabe que o banho não demora
mais do que um minuto e aperta as coxas com
mais força. Izabel Sarli começa saindo da
água e aproxima-se. Escorrega na lama do
fundo do rio, tenta manter o equilíbrio,
quase não consegue e os seios parecem geléia,
bamboleando. Izabel Sarli segura-os,
aperta-os, como se os oferecesse, a carne
mole sobrando por entre os dedos. Abelardo
contém a respiração, todos os músculos do
corpo retesados. Agora, meu Deus do céu. As
costas da cadeira estalam. Abelardo nem
escuta, os olhos fixos nos seios de Izabel
Sarli focados em close, a garganta seca,
apertando, doendo, as mãos agarrando os
braços da cadeira, as coxas comprimindo que
nem prensa o pau quente e duro como ferro.
No exato
momento em que a cena termina, o orgasmo
explode. O pau estremece, convulso, e
golfadas quentes da porra jorram no lenço,
por dentro da cueca. Abelardo mantém as
coxas apertadas e os músculos retesados
enquanto goza, a boca aberta, a garganta
seca, mal podendo respirar. Passa-se mais de
um minuto até que começa relaxando, o suor
escorrendo pelas costas, as pernas bambas,
como se tremessem de fraqueza. Fecha os
olhos e recosta-se na cadeira, ofegante, e
fica assim alguns minutos até ter certeza
que pode andar sem cair. Ninguém o
masturbou, como no cinema Candelária, mas
talvez fosse até melhor. Pelo menos pôde
ficar como morto na cadeira, degustando cada
segundo após a última convulsão. Respira
fundo e, devagar, levanta-se e vai ao
banheiro. Procura um reservado com chave,
tranca a porta, abaixa as calças, joga o
lenço melecado no cesto do lixo, senta-se no
vaso, fecha os olhos e revê os seios
bamboleantes de Izabel Sarli. Num impulso
incontrolável, agarra o pau e masturba-se
furiosamente, até gozar de novo. Quando sai
do reservado, Abelardo é outro homem.
Olha-se no espelho e sorri. Puta merda, hoje
foi do caralho. Lava as mãos com cuidado e
penteia-se. Sai do cinema e olha rua, o
calor ondeando no asfalto. Puta que o pariu,
agora só falta é vender a merda de alguns
queijos.
Abelardo
Mateus chega em casa tarde, cansado,
amarrotado, a cabeça doendo, mas ainda
sonhando com os seios de Izabel Sarli. Que
mulher, meu Deus do céu. Ah, se eu tivesse
uma mulher assim. Abelardo fecha os olhos e
os seios de Izabel Sarli saltam na sua
frente, grandes, moles, abanando como geléia.
Como ele gosta. Ah, se eu tivesse uma mulher
assim, meu Deus do céu.
Abelardo é um
dos representantes mais antigos da fábrica
de Laticínios São Caetano. Só dois colegas
têm mais tempo de casa do que ele. Mas nem
por isso as vendas de Abelardo são boas. No
quadro de produção da filial Belo Horizonte,
o seu lugar é sempre o mesmo. Último. Às
vezes, quando um ou outro cliente pede um
pouco mais, penúltimo. Mas nunca passa
disso. Último, quando muito, penúltimo. E
Abelardo sabe a razão. É por causa da merda
dos cinemas, puta que pariu. Mas semana que
vem eu largo essa merda. Ah, largo. É só não
comprar os jornais e as revistas, e pronto.
Freguês não falta. O pior, é a merda da
cabeça. Chega a esta hora, puta que pariu,
parece até urucubaca. Dói que dói.
- Assim não é
possível, Abelardo. Toda noite a sua cabeça
dói.
- Tá doendo,
Marileia. Demais.
- Dói hoje,
mas ontem também doía. Faz dois anos que a
sua cabeça dói, Abelardo, não é possível.
- E quê que eu
posso fazer, Marileia? Ela não dói porque eu
quero.
- Eu não digo
que ela dói porque você quer, Abelardo. Eu
digo que tenho vinte e cinco anos e que
preciso quem me foda.
- A culpa não
é minha, Marileia.
- Nem minha,
Abelardo.
Às vezes, mas
sempre pensando
em Izabel Sarli, sempre
imaginando que são os seios dela, Abelardo
consegue e Marileia goza, quase desmaiando
debaixo dele. Mas Marileia quer todas as
noites e Abelardo vai ao cinema todas as
tardes. E quando volta, a cabeça sempre dói.
E não é só a cabeça doer. A cada dia que
passa, menos efeito faz imaginar que os
seios de Marileia são os seios de Izabel
Sarli. Abelardo salta do ônibus na esquina
da av. Silviano Brandão. Na outra calçada um
grupo de rapazes e moças conversa em voz
alta. Uma das moças começa se afastando.
- Pra mim não.
Vou não. Preciso disso não.
Abelardo
olha-a, a blusa estofada pelo volume dos
seios. Meu Deus do céu, ah se Marileia fosse
assim. Pára e olha o letreiro iluminado da
farmácia Santa Eulália. Quem sabe eu tomava
uma aspirina e melhorava a merda da cabeça?
Não. Vou tomar
em casa. Começa andando.
Pelo menos, assim, Marileia vê que a cabeça
tá doendo mesmo e talvez desista de querer.
Acende um cigarro e puxa uma tragada. A
cabeça estoura. Puta merda, ô, caralho de
vida. Joga o cigarro na calçada. E o pior é
que Marileia, hoje, vai querer. Ah, vai.
Desde domingo que ela não fala noutra coisa.
Encolhe os ombros. Ah, foda-se. Se não der,
não deu. quê que eu posso fazer?
Entra em casa
já preparado. Curvado, amarrotado, como se
tivesse saído de uma quarta-feira de cinzas.
Abre a porta e chama Marileia. Ninguém
responde. Abelardo fecha a porta e olha a
sala. Em cima da mesa de centro está um
bilhete. Querido, vou chegar tarde. Mas não
se preocupe, virei de táxi ou alguém vem me
trazer. Seu jantar tá pronto no fogão e é só
esquentar. Marileia. Abelardo senta-se no
sofá com o bilhete na mão e sorri. Meu Deus
do céu, há quanto tempo eu tava esperando
que Marileia fizesse isto, hem? Recosta-se
no sofá e fecha os olhos, a cabeça já quase
não doendo. Assim, quem sabe, agora, a gente
até possa ser feliz? |